O que o alimento faz com o seu cérebro?

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Por Laiali Chaar

Para saber mais leia: Neuromentoria com Profa Dra Laiali Chaar

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      Sempre quando pensamos na função do alimento em nossas vidas lembramos dela como uma maneira de obter energia. Mas ele afeta (e muito) o nosso cérebro. Inclusive, até a habilidade do alimento de prevenir e proteger contra  diversas doenças afetando o funcionamento encéfalo está começando a ser mostrada nas pesquisas científicas.

       Um estudo realizado este ano na Universidade de Wisconsin nos Estados Unidos mostrou que o diabetes, que é causado por uma má alimentação na maioria dos casos, está associado ao aumento do risco para o desenvolvimento de Alzheimer. Ou seja, das pessoas que possuíam Alzheimer a maioria era diabética. No Brasil 12 milhões de pessoas possuem diabetes atribuído ao moderno estilo de vida em que comemos muitos alimentos industrializados e ricos em gordura e açucares e fazemos pouca atividade física. O açúcar é a principal fonte de energia para os neurônios funcionarem. O diabetes faz com que diversas regiões do cérebro, incluindo o lobo temporal medial onde as memórias são formadas, usem menos açúcar. Neurônios usando menos açúcar significa menos neurônios funcionando e formando memórias. Outro estudo científico mostrou que crianças que tem uma alimentação equilibrada, especialmente rica em fibras, possuem uma melhor performance em testes de QI.

      Estudos  também mostram que uma dieta equilibrada aumenta a longevidade, ou seja os anos de vida, de ratos em 50%. O efeito de uma dieta equilibrada na longevidade ainda não foi estudado em humanos. Mas, estudos mostraram que homens e mulheres que têm uma dieta equilibrada (com vegetais, frutas, ovos, nozes, peixes, aves, produtos com baixo teor de gordura, grãos e feijão) comparados com pessoas que tem uma dieta ocidental (rica em calorias vazias, gorduras, sal e fast-foods) tem menor incidência de doenças cardiovasculares que são a maior causa de mortes no Brasil e no mundo. Isso acontece também por causa do seu encéfalo sabia? Incrível, não!? Mas como o encéfalo afeta o desenvolvimento de doenças cardiovasculares? Há regiões no encéfalo (cérebro e tronco encefálico) que controlam a pressão arterial e frequência cardiaca. Essas regiões fazem isso por uma rede de neurônios que controla os órgãos do corpo: o sistema nervoso autônomo. O sistema nervoso autônomo é formado por simpático e parassimpático. O sistema nervoso simpático, quando ativado, aumenta seus batimentos cardíacos e contrai seus vasos aumentando sua pressão arterial. O sistema nervoso parassimpático diminui seus batimentos cardíacos diminuindo sua pressão arterial. Pessoas com uma dieta desequilibrada, não se sabe ainda porque, tem um aumento do sistema nervoso simpático e uma diminuição do sistema nervoso parassimpático, além do que é esperado em um organismo em equilíbrio. Esse desequilíbrio entre simpático e parassimpatico aumenta as chances de hipertensão, infarto  do miocárdio e acidente vascular encefálico. Assim, esse estudo mostrou que uma dieta equilibrada tem o mesmo efeito benéfico no sistema cardiovascular que uma classe de medicamentos usados para o tratamento de doenças cardiovasculares, os beta bloqueadores. Maravilhoso, não!?

   Uma dieta que é rica em Ômega‑3, um ácido graxo, está conquistando o amor de vários médicos e nutricionistas por ser cientificamente comprovado que auxilia nos processos cognitivos. Processos cognitivos são os processos que geram nossas idéias, raciocínios e pensamentos. Além disso, o Ômega-3 estimula a expressão de genes que produzem proteínas importantes para a comunicação e plasticidade dos neurônios. Óleo de peixe, que é rico em Ômega-3,  diminui sintomas de esquizofrenia, um transtorno mental em que a pessoa tem dificuldade entre separar o que é real e o que é imaginário.

      Muitos alimentos podem melhorar a condição do seu encéfalo e retardar o declínio natural do envelhecimento. Curcumina, um componente do açafrão, melhora a cognição de ratos com Alzheimer. Comer pimenta três ou mais vezes por semana faz você viver de 14% a 22% mais anos. (Os mexicanos devem viver bastante então.) Flavonóides, antioxidantes encontrados no coco, no chá-verde, nas frutas cítricas, no vinho e no chocolate amargo, e a vitamina D, presente no fígado de peixe, peixes gordos, cogumelos, derivados de leite, leite de soja, grãos e cereais, melhoram a função cognitiva em idosos, retardando o envelhecimento do cérebro. A gordura saturada, presente na manteiga, na banha de porco, no óleo de palma, no queijo, na carne e no óleo leva a um declínio cognitivo em ratos que tiveram traumatismo craniano e em idosos e a vitamina E leva à uma melhora. O complexo de vitamina B, principalmente a B6, tem efeitos benéficos na memória de mulheres em diferentes idades. A colina encontrada na gema do ovo, carne de soja, frango, vitela, peru, fígado e alface, melhora crises de convulsão e a cognição. Zinco, presente em ostras, feijão, nozes, amêndoas, cereais integrais e girassol, diminui o declínio cognitivo característico da idade. O declínio cognitivo em pacientes com Alzheimer está relacionando com baixo cobre que é encontrado em ostras, fígado bovino/cordeiro, castanha-do-pará, cacau, e pimenta do reino. Ferro, encontrado na carne vermelha, peixe, aves, lentilhas e feijão, melhora a função cognitiva em mulheres.

Mas como esses alimentos melhoram nossa cognição? Os efeitos dos alimentos na cognição e emoções podem começar antes da absorção do alimento pelo organismo, ativando receptores sensoriais olfativos e visuais. A ativação desses receptores pode alterar a ativação de neurônios envolvidos com a cognição. Além disso, as regiões do cérebro envolvidas na alimentação podem enviar axônios e ativar neurônios de regiões envolvidas com a função congnitiva. A leptina, um hormônio liberado pelo tecido adiposo após uma refeição, pode também chegar ao encéfalo e ativar receptores de leptina em regiões como o hipocampo e o hipotálamo e influenciar a aprendizagem e a memória. Sinais viscerais de receptores de nutrientes localizados no estômago e no intestino também podem modular a cognição. Neurônios do hipotálamo, uma região do encéfalo importante para muitos comportamentos fundamentais para a manutenção da vida, também inervam densamente o timo e podem ativar o sistema imunológico após uma refeição.  O intestino também apresenta inervação parasimpática e pode fornecer informações através do nervo vago por neurônios que chegam ao encéfalo e influenciar as emoções.  Inclusive, estão sendo testados métodos de estimulação do nervo vago para tratar a depressão crônica. A influência do microambiente intestinal em nossas emoções já foi tema de outro post do site.

     Agora, imagine o que acontece no seu cérebro quando você come uma colher de brigadeiro ou outro alimento que contenha açúcar. Cabe a seu cérebro decidir se repitirá outra colherada ou não. O neurotransmissor do sistema de recompensa, isto é, o sistema que faz com que nós desejemos repetir uma ação, é a dopamina. Há muitos receptores de dopamina no encéfalo. Esses receptores não estão igualmente distribuídos. Algumas áreas do encéfalo contém mais receptores dopamina. E esses locais que possuem mais receptores de dopamina fazem parte das áreas de recompensa. Drogas como álcool, nicotina ou heroína aumentam violentamente a liberação de dopamina nestas áreas e fazem com que a pessoa fique, em outras palavras, viciada. O açúcar também estimula a liberação de dopamina, mas essa liberação não é tão grande como a das drogas. Nem todos os alimentos liberam dopamina. Brocólis, por exemplo, não faz com que dopamina seja liberada. Isso explica porque é tão difícil fazer as crianças comerem vegetais.

      Quando você decide comer um prato saudável o nível de dopamina aumenta. Se você decide comer o mesmo prato por vários dias os níveis de dopamina aumentam nos primeiros dias. Mas, depois começam a diminuir cada dia mais e mais. Isso porque, quando se trata de comida, o cérebro dá atenção ao que é novo, ao que tem um sabor diferente. Isso acontece por duas razões. A primeira é para que o encéfalo aprenda a identificar quando uma comida é ruim. A segunda razão é que quanto mais variedade você tiver na sua dieta mais terá os nutrientes que você precisa. Esse princípio de uma dieta variada é seguido por uma sugestão amplamente dada por nutricionistas e médicos: comer um prato colorido é mais saudável. A variedade de nutrientes que um prato te fornecerá é mostrada pelo número de diferentes cores que ele possui.

      E o que acontece se você come o mesmo prato de doce todos os dias? Nos primeiros dias há um aumento de dopamina como acontece com prato saudável. Mas se você continuar comendo a sobremesa por vários dias os níveis de dopamina não irão diminuir. A liberação de dopamina é mantida por causa da recompensa. Em outras palavras comer muito açúcar aumenta a recompensa. Nesse sentido açúcar funciona um pouco como uma droga. Por isso nós adoramos comer alimentos com açúcar. Então, toda vez que açúcar é consumido começa um efeito dominó no cérebro que faz parte do sistema de recompensa. Um alto consumo de açúcar tem um alto efeito de vício no cérebro. Mas comer um pedaço de bolo de chocolate com recheio de chocolate e cobertura de chocolate de vez em quando não irá te machucar.

Para saber mais:

Willette AA, Bendlin BB, Starks EJ, Birdsill AC, Johnson SC, Christian BT, Okonkwo OC, La Rue A, Hermann BP, Koscik RL, Jonaitis EM, Sager MA, Asthana S. Association of Insulin Resistance With Cerebral Glucose Uptake in Late Middle-Aged Adults at Risk for Alzheimer Disease. JAMA Neurol. 2015 Jul 27.

Southon S1, Wright AJ, Finglas PM, Bailey AL, Loughridge JM, Walker AD. Dietary intake and micronutrient status of adolescents: effect of vitamin and trace element supplementation on indices of status and performance in tests of verbal and non-verbal intelligence. Br J Nutr. 1994 Jun;71(6):897-918.

Stein PK, Soare A, Meyer TE, Cangemi R, Holloszy JO, Fontana L.
Caloric restriction may reverse age-related autonomic decline in humans. Aging Cell. 2012 Aug;11(4):644-50. Epub 2012 May 21.

Fontana L, Partridge L, Longo VD. Extending healthy life span–from yeast to humans. Science. 2010 Apr 16;328(5976):321-6. .

Ikeno Y, Bertrand HA, Herlihy JT. Effects of dietary restriction and exercise on the age-related pathology of the rat. Age (Omaha). 1997 Apr;20(2):107-18.

McCann JC, Ames BN. Is docosahexaenoic acid, an n-3 long-chain polyunsaturated fatty acid, required for development of normal brainfunction? An overview of evidence from cognitive and behavioral tests in humans and animals.Am J Clin Nutr. 2005 Aug;82(2):281-95.

Lv J, Qi L, Yu C, Yang L, Guo Y, Chen Y, Bian Z, Sun D, Du J, Ge P, Tang Z, Hou W, Li Y, Chen J, Chen Z, Li L; China Kadoorie Biobank collaborative group.Consumption of spicy foods and total and cause specific mortality: population based cohort study. BMJ. 2015 Aug 4;351:h3942.

Gómez-Pinilla F. Brain foods: the effects of nutrients on brain function. Nat Rev Neurosci. 2008 Jul;9(7):568-78.

http://ed.ted.com/lessons/how-sugar-affects-the-brain-nicole-avena

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2 comentários em “O que o alimento faz com o seu cérebro?

    1. Olá Lorinete! Obrigada pela pergunta. Os alimentos podem alterar o funcionamento cerebral sim. Já há estudos sobre os alimentos e benefícios na memória em pessoas sem autismo e saúde cerebral. Vou pesquisar no caso do autismo e se encontrar algum comprovado escrevo uma matéria. Obrigada.

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